Uma iniciativa de duas crianças, Marcello (8) e Olivia (11), trouxe um pouco de esperança para aqueles que acreditam em um futuro melhor. Juntos, realizaram um financiamento coletivo que angariou R$ 23 mil para plantar 1.474 mudas de árvores nativas de Mata Atlântica. Para chegar a meta de plantio em uma área equivalente a um campo de futebol, a Fundação SOS Mata Atlântica contribuiu com outras 193 mudas.
A iniciativa de Marcello e Olivia surge em um momento de grande engajamento global de crianças e jovens pelo clima, já chamados de “Geração Greta” – em alusão à ativista ambiental sueca Greta Thunberg e seu movimento “Fridays For Future”, que realiza diversas ações pelo mundo, como a “Greve pelo Clima”.
Engajamento pela Mata Atlântica
Toda essa história começou após uma visita à base de restauração florestal da ONG, em Itu, em janeiro de 2019. No local, são produzidas mudas de árvores nativas da Mata Atlântica – aproximadamente 450 mil por ano – e usadas nos projetos de restauração florestal.
Após visitarem a área e conhecerem um pouco mais da história da SOS Mata Atlântica , das características da Mata Atlântica e dos riscos da degradação do bioma para o meio ambiente e para a sociedade, os amigos saíram de lá com uma ideia: ajudar a plantar um campo de futebol de árvores e, nas palavras deles, “unir forças para mudar o mundo”.
Os amigos contam que, antes da visita, tudo começou com a leitura de livros na escola.
“Quando eu viajei com o Marcello e a família dele, eu levei um livro que tinha ganhado na escola e que falava sobre aquecimento global. Aí ele disse que leu um livro parecido lá na escola dele. E aí depois que visitamos o projeto, tivemos essa ideia. No dia da visita, o Marcello perguntou se ele plantasse uma muda ajudaria. Eles disseram que sim e aí tivemos essa ideia”, conta Olivia.
“Tudo começou na minha escola quando eu estava no segundo ano. Li um livro chamado SOS Planet Earth e li algo que me inspirou a levantar dinheiro para ajudar as florestas tropicais da América do Sul”, afirma Marcello.
Apesar da distância – ele vivia no Canadá (atualmente na Inglaterra), e ela que mora no Brasil -, os amigos de infância tiveram sucesso no financiamento coletivo, lançado no dia 22 de abril de 2019 (Dia da Terra) no plataforma GoFundMe. Com doações entre R﹩ 5 e R﹩ 1.000 (esta última apenas uma) chegaram aos R﹩ 23 mil, divulgando a campanha nas redes sociais, colégios e entre amigos e familiares. Em setembro de 2020, com a flexibilização da quarentena do novo coronavírus, Olivia pode entregar o cheque simbólico para a Fundação e fazer o plantio da primeira muda do “Campo dos sonhos” dela e de Marcello – que presenciou tudo por videoconferência.
Durante a campanha de arrecadação, as crianças participaram de feiras na escola para divulgação da campanha, bem como para vender camisetas da ONG, jogos da Mata Atlântica e até mesmo tentaram fazer representações sobre a importância da floresta para proteger comunidades de enchentes.
“O Marcello ficou muito interessado e engajado, sua curiosidade acabou sensibilizando outros amigos. Chegou a levantar uma pequena quantia – 30 dólares – que queria doar. A ida ao projeto foi enriquecedora e as crianças voltaram super animadas e decididas a fazer algo. O resultado foi um vídeo para levantar o dinheiro e desenvolver algo mais significativo. Eu o ajudei a formatar o projeto para uma doação maior e assim surgiu a campanha”, afirma Paola Frumento Ferraz, mãe de Marcello.
Ciência e Mata Atlântica
A propriedade onde as mudas serão plantadas é uma antiga fazenda de café, possui mais de 500 hectares, onde acontecem ações de educação ambiental, mobilização, cursos e capacitações. Mais da metade do território da propriedade foi recuperado com o plantio de árvores nativas do bioma, e algumas já alcançam 10 metros de altura.Mais de 48 mil pessoas já visitaram o local.
Somando todos seus projetos de restauração florestal, a Fundação SOS Mata Atlântica já plantou mais de 40,5 milhões de árvores nativas em 23 mil hectares, o equivalente ao tamanho de Recife.
A ação da dupla de amigos é fundamental para a Mata Atlântica. Estudos sobre a relação entre Mata Atlântica e clima apontam que o bioma apresenta as melhores oportunidades para a restauração de florestas tropicais em todo o mundo. Um artigo científico publicado pela revista Science Advances, por exemplo, identificou mais de 100 milhões de hectares onde florestas tropicais foram desmatadas e que apresentam as oportunidades mais convincentes de restauração para mitigar as mudanças climáticas, escassez de água e a extinção da vida vegetal e animal. O Brasil, em especial a Mata Atlântica, foi o hotspot global para a conservação da biodiversidade com a maior área prioritária para a restauração.
No vídeo produzido para a campanha do Marcello e da Olivia é possível ver a surpresa de ambos com o quase desaparecimento do bioma, uma vez que ele conta hoje com apenas 12,4% do que possuía quando os portugueses chegaram no Brasil”.
Um estudo realizado na fazenda que é a base da área de restauração florestal da SOS Mata Atlântica, em Itu, mostrou ainda como a restauração do bioma é importante para espécies de mamíferos silvestres. A pesquisa identificou 20 espécies nativas de mamíferos de médio e grande porte que já ocupam esta área de Mata Atlântica recuperada, como gato-do-mato-pequeno (Leopardus guttulus), gato-mourisco (Puma yagouaroundi), lontra (Lontra longicaudis), paca (Cuniculus paca), entre outras.
Das espécies nativas registradas, seis encontram-se em algum grau de ameaça de extinção. Isso demonstra a importância da área para a conservação da diversidade local e regional. Além disso, grupos familiares de algumas espécies foram encontrados, como de cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), capivara (Hydrochoerus hydrochaeris) e gambá-de-orelha-branca (Didelphis albiventris).
“Durante a visita, mostramos o mapa da localização da Mata Atlântica no Brasil e quando souberam o quanto tinha de floresta, eles ficaram impressionados. Neste momento, questionaram quantas mudas seriam necessárias para plantar e recuperar o que foi perdido. No final, a mãe de Marcello perguntou qual seria o valor da muda e, três meses depois, já no Canadá, nos enviou o link da campanha que eles tinham criado. Essa é uma grande lição para todos nós. Quando conhecemos algo, no caso a Mata Atlântica, e entendemos a sua importância, é um grande passo para que ações como essa aconteçam. Ficamos muito felizes pelo engajamento deles em prol da Mata Atlântica, que ainda precisa ser mais conhecida por boa parte da população brasileira”, afirma Kelly De Marchi, coordenadora de Educação Ambiental da Fundação SOS Mata Atlântica.
Os projetos e campanhas da SOS Mata Atlântica dependem da ajuda de pessoas, assim como Marcello e Olivia, e também do apoio de empresas para continuar a existir.
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