O surgimento da Bruxa – O papel da mulher [#2]

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*Este conteúdo é uma transcrição (editada) da fala de Bernardo Gregório, numa entrevista gravada para o programa “Entre o céu e a terra” da TV Brasil

 

Neste segundo “episódio” da série, temos como tema, além do surgimento da bruxa nos primórdios históricos da humanidade, o surgimento do tabu e do patriarcado. É também mencionada a manifestação do Complexo de Édipo, futuramente criado por Freud. Acessem o primeiro post para que possam entender melhor na sequência.

O primeiro episódio referiu-se ao surgimento da Matriarca, e este tópico se inicia discorrendo sobre como isso começou a mudar:

E isso começa a mudar com uma revolução, que na verdade, foi a segunda revolução que aconteceu na história. Vou voltar então, para a primeira. Qual foi a primeira revolução? A primeira revolução foi feminina. Houve uma mulher, ou várias, não se sabe quando, não se sabe quem, mas houve alguém que um belo dia quando haveria o ritual de fecundidade no final da primavera/começo do verão, ela falou:  Não, eu não quero ir nesse ritual. No matriarcado, não existe imposição de nada, as coisas acontecem porque elas são tradicionais e porque estão na época de ocorrer. Portanto, a ideia de falar “não”, é inédita. Essa mulher que falou não, eu não vou no ritual de fecundidade foi a “primeira no planeta” que não foi fecundada. Ela não foi no ritual, consequentemente ela ovulou e o óvulo não foi fecundado. O  que acontece depois disso? Quinze dias depois ela menstrua. Imaginem, nunca tinha se visto isso na história. Ninguém sabia o que era menstruação. A ideia de sangue é automaticamente associada à ideia de doença, de morte. Uma pessoa que sangra, é uma pessoa que está doente. Então, com certeza, essa moça foi amaldiçoada pela deusa; a deusa queria que ela fizesse o ritual mas ela se recusou a fazer o ritual, ela rompeu com a deusa da terra e teve que ser expulsa do clã. Pelo simples motivo de que se ela ficasse no clã, o clã inteiro ia ser amaldiçoado junto com ela. Talvez não tivesse colheita. Dessa forma, ela foi expulsa e foi morar na floresta, sozinha. Isso deve ter acontecido com várias mulheres ao longo do tempo.

Algumas não conseguiram sobreviver. Imaginem, ficaram na floresta e não sabiam o que fazer. Outras conseguiram. Como elas conseguiram sobreviver? Elas tinham que se virar com o que tinha na floresta. Tinham que caçar pequenos animais. E pra isso, elas acabaram domesticando o gato. Porque quem domesticou o cachorro, foi o homem quando ia na caça. Para caçar pequenos animais sozinha na floresta, o gato ajuda mais do que o cachorro. Ela teve que aprender raízes, ela teve que aprender folhas e teve que aprender quais frutos podiam ser comidos e quais não. Imaginemos certos fungos, certos cogumelos, alguns alucinógenos, outros mortais, outros comestíveis e ela tem que descobrir todos esses segredos, todas essas coisas da floresta. E morando sozinha na floresta, continuou menstruando a cada vinte e oito dias. A mulher começa a perceber que ela brigou com a deusa da terra, mas tem uma outra deusa que a recebe, que é a deusa da lua. Aí entra o ciclo de vinte e oito dias. Então ela começa a reverenciar a Lua. Prefere a lua cheia porque numa noite de lua cheia ela pode enxergar e é muito melhor as coisas da noite. Ela é uma mulher mais noturna do que diurna, porque durante o dia pode trombar com caçadores. Ela sabe segredos, segredos de cura, com raízes e ervas e as mesmas raízes de ervas também podiam servir facilmente para matar. Sendo assim, ela conhecia segredos da vida e da morte. Essa é a bruxa: a mulher que disse “não”.

 

 

Com o tempo, até mesmo quem morava no clã de vez em quando tinha que pedir ajuda à ela, porque era a mulher que sabia curar determinadas doenças. E ela menstruava, e se menstruava, tinha TPM. Então, “reza pra não encontrar com a bruxa no dia de TPM, que em vez de te curar, ela te mata!”(risos). Todo mundo tinha muito medo da bruxa. Essa mulher isolada que mora na floresta e que faz coisas que ninguém sabe o que acontece lá; ela não tem a relação com a terra e com a vida cotidiana e prática, ela tem relação com o mundo espiritual “estranho”, ela tem a relação com seres pouco conhecidos. Essa é a primeira revolução.

A segunda é a revolução masculina. Os homens cansados de serem “usados” pelas mulheres, cansados de serem tratados como objetos (risos), eles resolvem mudar toda a história. E os “coitados” dos homens, não tinham nada pra contar; eles não podiam ter filho, eles não tinham segredos da culinária, não tinham segredos da bruxa, nada! A única coisa que tinham era força bruta, a força física. Porque depois de milhares de anos, as mulheres “obrigando” eles a caçar, a lutar, a fazer todo o serviço pesado, eles ficaram por seleção natural muito mais forte do que a mulher. Se compararmos a diferença física que existe entre homens e mulheres, com a diferença física que existe entre outros mamíferos, a diferença do humano é muito maior do que, por exemplo, da onça macho com a onça fêmea. Entre eles é mais ou menos a mesma coisa, já no ser humano a diferença é muito grande.

Por causa dessa época de matriarcado os homens mais fracotes simplesmente morriam. Foram selecionados os homens mais fortes. E é essa mesma força que eles vão usar contra a mulher. Eles vão lá, depõem a matriarca, matam todos que se colocarem contra, e pela força, tomam o poder. Bom, mas elas são mães, e o homem vai ser o quê? Inventa uma palavra: vai ser pai, pronto! Mas como é que vai ser pai? O que o homem tem a ver com os filhos? Ah, não, mas a gente prende as mulheres e obriga todas as mulheres a poder ter só um homem, porque assim esse homem vai ser pai do filho. Ah, mas e se ela tiver outro?  A gente mata elas, pronto! Está estabelecido o primeiro tabu. Falando sobre psicanálise, existe o tabu do Freud. Então, o primeiro tabu é: todas as mulheres só podem ter um homem. Note que ninguém disse quantas mulheres um homem pode ter, ele pode ter quantas ele conseguir conquistar. Conquistar à força, que é aquela imagem do troglodita dando com a clava na cabeça da fulana e arrastando pelos cabelos.

Isso ficou assim por algum tempo. Até que alguém questionou: bom, mas a fulana tinha o marido antes, o marido dela morreu. E agora, ela pode se casar de novo? Se ela se casar de novo, o filho vai ser do primeiro marido ou do segundo? Na dúvida, a gente mata ela, porque aí já não tem problema, morreu o marido, ela morre junto. Na Índia, até bem pouco tempo atrás, em torno de um século/um século e meio, as mulheres eram queimadas com o marido (eram várias), na mesma pira (fogueira). O marido morria, ele era cremado e as esposas iam junto também. Os astecas faziam igual. É bem comum essa ideia de que se o marido morresse, para não haver dúvida, matasse fulana também. À partir daí, eles criaram outra ideia de que toda mulher deve casar virgem – segundo tabu. Já que existe uma maneira de você saber quem é virgem, quem não é, de um ponto de vista físico, óbvio, exige a virgindade que já não tem mais dúvida de “quem é o pai”, de quem é o filho. Foi estabelecido o segundo tabu.

A situação ficou mais ou menos bem, até que houve um terceiro problema. A segunda geração de homens cresceu; e o que acontecia? Todas as mulheres disponíveis naquela tribo, elas já estavam casadas de um jeito ou de outro. Então, nessa nova geração, para conseguir mulheres, eles tinham que ir na tribo do vizinho, brigar com eles, matar todos os homens de lá e trazer as mulheres de lá à força. Isso foi feito durante algum tempo, mas isso dava muito trabalho. Alguém teve a ideia: vamos matar os homens daqui mesmo e ficar com as mulheres daqui mesmo, não precisa ir no vizinho. E foi o que fizeram: mataram os homens da própria tribo e se casaram com as mulheres da própria tribo, que eram os pais. Eles mataram os pais e casaram-se com as mães e com as irmãs. Fizeram isso, mas imediatamente pensaram: mas e na próxima geração? Na próxima geração, quem vai morrer sou eu. Conclusão: vamos proibir isso! Fica proibido matar o pai e fica proibido se casar com a mãe e/ou com a irmã. Note que matar a mãe pode, casar com a filha também pode, só não pode casar com a mãe e com a irmã e matar o pai. O famoso Complexo de Édipo nasceu daí. Com esses três tabus, fica instituído o patriarcado, a famosa pátria.

O patriarcado, pelo que percebemos, deu bem certo nos últimos dez mil anos. E o tempo que esses tabus foram instituídos “está funcionando”, mantendo esses três preceitos, que é o que faz existir a possibilidade de “pai”. Mãe é uma coisa natural, é óbvia, é dada pela natureza. A ideia de pai é artificial e só pode ser conquistada à força. Visto isso o patriarcado inventa lei, que começa com os tabus; e para você ter uma lei, você tem que ter uma punição pra quem infringe essa lei. E, normalmente, a punição é a morte. Existem esses reflexos patriarcais em várias religiões. A ideia de punição do adultério e inclusive punição da mulher adúltera que foi estuprada (a mulher foi estuprada e eles a consideram adúltera). Por exemplo, segundo a lei do Alcorão, ela precisa ser apedrejada, mesmo ela tendo sido estuprada diz-se que a culpa é dela, ela que deve de alguma forma ter chamado atenção. Inclusive, elas usam aquele xador e a burca pra evitar que ela chame a atenção do homem. A teoria é a de que o homem é um ser inferior e não consegue lidar direito ou tão bem com as suas emoções quanto a mulher, que é mais evoluída. Então, como o homem não consegue lidar com as suas emoções, cabe à mulher, mais evoluída, não instigar o homem. Por isso, a mulher se cobre pra não instigar o homem, é essa ideia. É claramente patriarcal a ideia de que toda mulher só pode ter um homem e a ideia da virgindade. Estes são só uns exemplos, existem muitos outros.

 

 

Agora, e o que foi feito daquele matriarcado? O matriarcado foi deliberadamente combatido ao longo da história. Em algumas civilizações, tivemos um equilíbrio entre a visão matriarcal e patriarcal como no Egito, por exemplo. Mesmo os maias tinham um equilíbrio entre a visão matriarcal e patriarcal. Na Grécia antiga, no começo, mantinha-se esse equilíbrio e existiam várias religiões matriarcais, como os mistérios de elêusis, que depois posso falar um pouco mais. Havia os mistérios de Éfeso, que eram as religiões que cultuavam Ártemis, a deusa da lua; A deusa da terra Deméter, que era cultuada em elêusis. E começaram a aparecer várias religiões patriarcais com deuses masculinos. O principal Deus masculino é o sol. Se você tem a terra e a lua como Deus você tem o sol como Deus; às vezes o céu, às vezes o sol; às vezes os dois juntos, ou dois deuses masculinos separados: o sol e o céu, mas com um certo equilíbrio.

Porém, na Grécia antiga, houve a invasão dos Dórios. Os Dórios faziam parte de povos indo-europeus que vinham da região do Mar Cáspio, do Cáucaso. Eles conheciam o ferro, o cavalo e eram excessivamente agressivos, bélicos e patriarcais ao extremo. Eram nômades, iam saqueando, invadindo e passando para uma próxima região. De lá, eles invadiram onde hoje é a Índia. Invadiram a Península Arábica e chegaram a ter confrontos, que eram os hititas e afrontaram também os egípcios e chegaram pelo outro lado na Grécia. Quando eles chegaram na Grécia Continental, esse povo que chegou na Grécia Continental, chamava-se Dórios. Eles tinham uma superioridade bélica muito maior por causa do ferro e do cavalo. Conquistaram e destruíram todas as civilizações que existiam ali antes, que é o que conhecemos hoje em dia como civilização micênica. Eles destruíram tudo a ponto de hoje em dia não haver registro histórico da civilização micênica. Existem algumas ruínas mas não conhecemos direito a língua que eles falavam (que não é o grego, eles falavam uma outra língua), e não conhecemos direito a estrutura da civilização deles. Temos uma noção muito pela mitologia, pouco pela arqueologia e aos poucos vamos descobrindo um pouco mais. Não contentes, eles começaram a invadir também as ilhas. E toda a região insular da Grécia foi conquistada e uma outra civilização foi destruída também, que é a civilização minoica, cuja capital ficava em Creta, até que houve a conquista de Cnossos em Creta e a destruição completa da civilização minoica e a imposição do patriarcado, sempre à força.

Com todas as restrições às mulheres e perseguição às religiões matriarcais, não havia como aceitar numa visão patriarcal que continuassem existindo religiões matriarcais. Isso é visto na mitologia como a guerra contra as amazonas. Chama-se Amazonomaquias, em que eles sistematicamente guerrearam contra essas mulheres (também sobre o cavalo), que eram as últimas que resistiam em nome de Ártemis contra o patriarcado, mas elas foram derrotadas também. Dessa forma, foi instaurado na Grécia, em toda a região helênica, um patriarcado extremo que é o que chamamos de idade média helênica: O período das trevas. Por quê? Porque foi muito parecido com o que aconteceria depois na Europa onde houve uma involução cultural enorme em que foi necessário um renascimento numa fase mais posterior.

 

Musée du Louvre, décembre 2004
Amazonomaquia (luta entre gregos e amazonas) relevo de sarcófago, c. 180 a.C., encontrado em Salonica,Grécia, 1836

 

 

Continua na parte [#3] – Dionísio, Sátiros e Ninfas – Ritos e Rituais 

Vídeo da entrevista:
Entre o Céu e a Terra – Entrevista Bernardo de Gregório

 

 

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